15 de mar. de 2016

FEDERICO GARCIA LORCA – Dois Poemas



– PEDRO LUSO DE CARVALHO

No que se refere a morte do grande poeta espanhol Federico Garcia Lorca, transcrevemos o que o jornal El Liberal, de Madri, publicou no dia 2 de novembro de 1936 (in Ian Gibson, O assassinato de Garcia Lorca, Trad. de Ernani Ssó, Porto Alegre, L&PM Editores, 1988, p. 271):
Mas será possível? Federico Garcia Lorca, o imenso poeta, assassinado pelos facciosos?
Uma última esperança de que tamanho crime não tenha se realizado leva-nos a perguntar: mas será possível a monstruosa aberração que supõe o assassinato do mais alto poeta espanhol dos nossos dias?
Todos os jornais publicaram a notícia que, segundo um jornal de Albacete, procedia de Guadix.
Conhecemos bem a louca e fria perversão dos traidores. Mas um nobilíssimo impulso da nossa alma nos leva a duvidar da veracidade da horrível informação.
Federico Garcia Lorca fuzilado pelos degenerados facciosos! Será possível tanta maldade? E embora temamos que sim, que essa gente é capaz de tudo, queremos acolher uma última esperança, repetimos, queremos acreditar que tudo, até a escala da maldade dos fascistas, tem um limite.
A Espanha inteira, toda a Espanha democrática e republicana, vive momentos de angústia e os viverá enquanto não seja retificada ou ratificada a inimaginável maldade dos verdugos.
Federico Garcia Lorca foi fuzilado em agosto de 1936, em Granada, no início da Guerra Civil Espanhola, e seu corpo nunca foi encontrado. Estava com 38 anos de idade, quando foi assassinado, e já era considerado um dos maiores poetas e teatrólogos da Espanha.
Os poemas que aqui serão transcritos, o primeiro, com tradução, A Lua e a Morte, e, o segundo, Gacela del amor desesperado, no idioma do poeta, integram a Antologia Poética de Federico Garcia Lorca, obra bilíngue, com tradução de William Agel de Mello, São Paulo, Martins Fontes, 2001, p.39-41; 218, 220:


A LUA E A MORTE

– FEDERICO GARCIA LORCA



A lua tem dentes de marfim,
Quão velha e triste assoma!
Estão os álveos secos,
os campos sem verdores
e as árvores murchadas
sem ninhos e sem folhas.
Dona Morte, enrugada,
passeia pelos salgueirais
com seu absurdo cortejo
de ilusões remotas.
Vai vendendo cores
de cera e de tormenta
como uma fada de conto
má e enredadora.

A lua comprou
pinturas da Morte.
Nesta noite turva
está a lua louca!

Eu, enquanto isso, ponho
em peito sombrio
uma feira sem músicas
com tendas de sombra.

-/-/-


GACELA DEL AMOR DESESPERADO

– FEDERICO GARCIA LORCA



La noche no quiere venir
Para que tú vengas,
ni yo pueda ir.

Pero yo iré,
Aunque um sol de alcranes me coma la sien.

Pero tú vendras
Com la lengua quemada por la lluvia de sal.

El día quiere venir
para que tú no vengas,
ni yo pueda ir.

Pero yo iré
entregando a los sapos mi mordido clavel.

Pero tú vendras
por las turbias cloacas de la oscuridad.

Ni la noche ni el día quierem venir
para que por ti muera
y tú mueras por mi.



*  *  *