26 de abr. de 2014

MANOEL BANDEIRA – Cotovia



– PEDRO LUSO DE CARVALHO

Manoel Bandeira entusiasma a geração paulista, em 1919, quando a revolução modernista dá os seus primeiros passos, com a publicação de Carnaval, paga pelo seu pai. O livro foi analisado com poucas palavras pela A Revista, que era dirigida por Monteiro Lobato. João Ribeiro não poupa elogios ao poeta.
No ano seguinte, com a morte de seu pai, o poeta muda-se da Rua do Triunfo para a Rua do Curvelo nº 53 (hoje Dias de Barros), onde viveu por treze anos e escreveu três livros: Ritmo dissoluto, Libertinagem, Crônicas da Província do Brasil  e muitos poemas de Estrela da manhã.
Bandeira, que já se correspondia com Mario de Andrade, conhece pessoalmente o escritor em 1920, dois anos antes da Semana da Arte Moderna, realizada em São Paulo, da qual não quis participar. Foi nesse ano (1922), que visitou São Paulo, e que teve a oportunidade de conhecer Paulo Prado, Couto de Barros, Tácito de Almeida, Menotti del Picchia, Luís Aranha, Rubem Borba de Morais, Yan de Almeida Prado.
Foi no mesmo ano da Semana da Arte Moderna que o poeta travou amizade com Jaime Ovalle, Rodrigo M. F. de Andrade, Dante Milano, Osvaldo Costa, Sérgio Buarque de Holanda, Prudente de Morais Neto. Com esses amigos costumava jantar no Restaurante Reis, onde comia o bife à moda da casa, a preço módico.
Segue, de Manoel Bandeira, o poema Cotovia (In  Manoel Bandeira. Seleta de prosa e verso; organização, estudos e notas de Manoel de Moraes. 2ª ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1975, p. 132-133):

COTOVIA
– MANOEL BANDEIRA

Alô, cotovia!
Aonde voaste,
Por onde andaste,
Que tantas saudades me deixaste?

– Andei onde deu o vento.
Onde foi meu pensamento.
Em sítios, que nunca viste,
De um país que não existe...
Voltei, te trouxe a alegria.

– Muito contas, cotovia!
E que outras terras distantes
Visitaste. Dize ao triste.

– Líbia ardente, Cítia fria,
Europa, França, Bahia...

E esqueceste Pernambuco,
Distraída?

– Voei ao Recife, no cais
Pousei na Rua da Aurora.

– Aurora da minha vida,
Que os anos não trazem mais!

– Os anos não, nem os dias,
Que isso cabe às cotovias.
Meu bico é bem pequenino
Para o bem que é deste mundo:
Se enche com uma gota de água.
Mas sei torcer o destino.
Sei no espaço de um segundo
Limpar o espaço mais fundo.
Voei ao Recife, e dos longes
Das distâncias, aonde alcança
Só a asa da cotovia,
– Do mais remoto e perempto
Dos teus dias de criança
Te trouxe a extinta esperança,
Trouxe a perdida alegria.


(Opus 10)
*
* Para ler a quarta parte, clique em: Desencanto

 REFERÊNCIA:
BANDEIRA, Manoel. Seleta de prosa e verso; organização, estudos e notas de Manoel de Moraes. 2ª ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1975.
  

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Pedro